Muito Além do Inverno é o romance mais recente de Isabel Allende e foi publicado no Brasil em 2017 pela editora Bertrand. A história se passa no Brooklyn e conta as aventuras de um casal para se livrar do cadáver de Kathryn Brown.
Lucía é uma imigrante chilena e professora convidada na Universidade de Nova York, Richard é um americano e chefe de Lucía na mesma universidade. Lucía e Richard vivem fugindo do fato de se sentirem atraídos, mas por conta do passado, e do fato de passarem dos 60 anos, resolvem evitar o envolvimento. Lucía sofreu muito com a ditadura do Chile e enfrentou mais separações do que almejava na vida. Richard é viúvo de uma brasileira e, depois da triste morte da esposa e filhos, resolve se fechar em uma espécie de penitência.
Tudo continuaria da mesma forma se não fosse por um estranho episódio: Richard bate no carro de uma jovem durante a maior nevasca dos últimos anos, ela foge sem nem ao menos desejar um reparo e Richard consegue, com muito custo, lhe entregar o cartão. No meio da noite Evelyn bate na porta de Richard desesperada por ajuda. Ela na verdade é uma imigrante ilegal, pegou escondido o carro do patrão para comprar fraldas e acabou descobrindo o cadáver no porta-malas. Evelyn está aflita, tudo leva ela a crer que vai parar na prisão, Lucía se compadece da menina e convence o professor mal humorado a ajudar na missão de se livrar do corpo.
“Lucía Maraz maldizia o frio. Tinha o caráter estóico da gente de seu país: estava habituada a terremotos, inundações, tsunâmis eventuais e cataclismos políticos; quando não acontecia nenhuma desgraça em um prazo razoável, ficava preocupada.”
Allende mais uma vez narra com maestria o sofrimento de toda uma América Latina. Em meio a gangues, tráfico, ditaduras e perseguição política ela conta a história de três personagens que tem em comum um passado extremamente triste em um continente diverso. Através dos olhos de Lucía vemos a história do golpe militar chileno que causou a morte de milhares de opositores. A mãe de Lucía dedica à vida em busca o corpo do filho desaparecido durante os anos do golpe. Após anos vivendo no exílio, nossa coprotagonista resolve se dedicar a vida de pesquisadora e estudar a fundo as ditaduras que alastraram a América no final do século XX.
Richard também é pesquisador, aprendeu o português desde a infância por conta de sua mãe ser portuguesa. Sua falecida esposa era brasileira, e ele um apaixonado pelo país. Evelyn é guatemalteca, vinda de um país muito pobre e preso no eterno conflito das gangues. Evelyn é obrigada a se refugiar nos EUA após o assassinato brutal dos irmãos e da ameaça de morte. Através da personagem vemos não só as consequências da violência na América Central, como também o árduo caminho que os imigrantes ilegais têm que enfrentar em busca de uma nova vida no norte.
“O barulho das panelas começava com umas batidas solitárias em um pátio, às quais logo se somavam outras em um coro ensurdecedor, que se espalhava pelos bairros de classe média e alta da cidade como um anuncio do apocalipse.”
O Brasil aparece várias vezes no romance. Seja por conta da Operação Condor, das consequências da ditadura, dos protestos na época das olimpíadas ou do passado de Richard, fato é que o nosso país é uma figura importante na narrativa. A autora retratou muito bem o Brasil, não deixando de lado as superstições, a religião afro e a cultura do Rio. Por conta de o romance ser recente, temos muito das consequências da crise 2008 que culminou no extremismo e na vitória de Donald Trump nas eleições americanas. Os imigrantes sofrem com a perseguição, o preconceito e a violência. Mesmo Lucía que é professora, e possui uma condição de vida melhor, enfrenta as dificuldades. Quando dirige o carro de Richard é parada pela polícia, eles só a deixam em paz após dizer que é uma empregada levando o patrão ao hospital. Nada mais lógico do que uma latina ser empregada ou assaltante. Evelyn sofre uma vida miserável, seu emprego é quase um trabalho escravo.
Allende não tem papas da língua ao falar sobre o assunto, os subempregos só existem porque os americanos se aproveitam dos milhares de refugiados necessitados de dinheiro para viver. A América da autora não é amigável aos imigrantes, o sonho americano não é idealizado, a vida na terra natal seria a ideal, não fosse por toda a violência e a crise econômica. Allende nos fala da intervenção americana geradora das várias ditaduras durante o período da guerra fria, não foge de nenhum assunto, por mais que seja polêmico.
O segundo romance da autora só me fez desejar conhecer mais da sua obra literária. A temática e a escrita são magnéticas para mim, foi muito fácil de engolir as páginas de Muito Além do Inverno, o livro também me atiçou a curiosidade de estudar mais sobre a nossa ditadura militar. Leitura ultra recomendada e não duvide, Isabel Allende é um amor.
Oi Beatriz.
Achei interessante a autora ter inserido no contexto alguns aspectos do Brasil, fazendo com que o leitor daqui consiga se identificar com algumas partes do enredo.
Porém, não me interessei tanto pela premissa do livro. Parece uma leitura um pouco mais densa, por causa de todos os temas abordados, política, empregos e etc.
Beijos
Olá Beatriz,
Não conhecia essa autora, mas com certeza vou dar uma conferida nas obras dela.
Já fui conquistada por esse livro só lendo a sinopse, mas depois de conferir a resenha e conhecer melhor a história, adorei o que encontrei. Uma trama muito bem criada, extremamente realista, e o que mais gostei, é o fato da autora abordar tantos assuntos polêmicos de uma forma nua e crua, bem direta, trazendo a cruel realidade da luta dos tantos imigrantes ilegais por uma vida nova.
Vou anotar essa dica, espero ter a oportunidade de ler algum dia.
Beijos
Oi, Beatriz,
Acaba sendo intrigante essa ligação entre os três personagens – trazendo questões importantes, discutíveis e plausivelmente humanas.
O ponto pé inicial de como tudo foi desencadeado, é um pouco diferente, mas vemos que a autora soube conduzir tudo com sabedoria, indo a fundo e explorando cada linha e página, mediante essa ligação e situação criada.
Oi Beatriz!!
Confesso que bem começo não me interessei pelo livro, achei que ia ser uma história fraca, e fiquei meio perdida na sinopse, o que despertou a minha curiosidade foi tudo o contexto que citou e já vi em outras resenhas também, família, política, luto, tudo o que eu não imaginava que haveria no livro, não de forma impactante.
Bom saber que a escrita te envolveu.
Beijos
Oie!
O livro é bem diferente do que eu imaginava, e foi uma surpresa até que muito boa.
Pela resenha me parece ser um livro muito rico, não só da estória em si, mas também por todos os detalhes colocados, como falar do nosso país e da ditadura. Quero muito ler.
Bjokas!
Olá!
O livro não é só um romance mas uma historia, você aprende com elas. Gostei muito do livro, tem uma premissa muito boa e além vemos os sofrimentos do personagens, vemos como eles lutar para ter uma vida melhor, conhecemos mais as culturas dos pais e os sofrimentos deles..Gostei bastante e espero poder ler em breve!
Meu blog:
Tempos Literários
Oi Débora!
Não conhecia esse livro da autora, somente A Casa dos Espíritos. O que me atraiu na obra é essa abordagem mais atual, retratando problemas contemporâneos e mostrando aspectos do Brasil. Com a forma de escrita que a autora tem deve ser uma ótima leitura. Beijos
Oi Beatriz (desculpa por errar seu nome antes, força do hábito)!
Se você gostou mesmo da escrita de Allende, te recomendo Arranca-me a Vida, de Ángeles Mastretta. É um livro ambientado no México do século passado que acompanha a evolução da protagonista Catalina. Beijos