Faz um bom tempo que eu não venho aqui falar de filmes com vocês. A verdade é que eu não tenho assistido nada que tenha me dado vontade de sentar na frente do notebook e compartilhar a minha experiência. Vocês também estão sentindo falta daqueles filmes que te deixam olhando para o teto e questionando várias coisas sobre a sua própria vida, ansiando por uma mudança? Bem, eu finalmente encontrei um filme que me deixou exatamente assim. Então se preparem porque hoje nós vamos falar sobre: Colette.
Colette é uma adaptação biográfica da vida de Sidonie Gabrielle Colette, uma escritora francesa da década de 20 responsável pela série “Claudine”, que fez muito sucesso na época – a tornou referência na literatura francesa. Eu não conhecia a vida e obra dessa autora até o filme cair no meu colo e, agora que eu a conheço e tenho uma ideia da importância de sua obra para a época, eu não podia fazer outra coisa se não compartilhar com vocês a experiência exuberante que é conhecer a vida dessa escritora.
Keira Knightley assume o papel de Colette, uma jovem do campo que vem a se casar com um autor famoso da época chamado Willy. Desde o começo do filme é perceptível que, apesar de inocente, Colette não é uma mulher comum. Ao entrar em contato com a vida agitada do marido, ela acaba se cercando de grandes escritores e pensadores franceses, o que só fez com que a sua personalidade forte e o seu talento para a palavras ficassem ainda mais evidentes ao longo da trama.
Logo no começo do enredo é revelado que Willy não é o autor das obras que publica, contratando diversos escritores fantasmas para colocar suas ideias no papel. É na necessidade do marido de publicar uma nova obra que Colette acaba rascunhando os primeiros capítulos de “Claudine à l’école”, originalmente publicado em 1900. A partir desde ponto do filme, Willy passa a publicar os escritos de Colette sob o seu nome, levando o crédito toda a fortuna e glória que o sucesso do livro gerou.
O filme aborda um período histórico muito importante na França. Era uma época onde a cultura estava se revolucionando, novos autores estavam surgindo e novas tendências estavam sendo criadas. E no centro disso tudo está a nossa protagonista, uma jovem do campo, sem muitas experiências que, assim como muitas mulheres da época, dependia do marido para tomar as melhores decisões da sua vida. Mais ao contrário de muitas mulheres, Colette resolveu quebrar as regras da sociedade e criar para si um mundo próprio.
Um ponto importante do filme é que desde de o começo percebemos que Colette está em um relacionamento abusivo. Sim, Willy nunca partiu para a violência física, mas quando ela se recusava a escrever mais, ele a deixava trancada no quarto até que ela entregasse as páginas que ele desejava. Os abusos não ficavam apenas na escrita. Willy ditava a rotina de Colette, suas roupas, seu corte de cabelo e as pessoas com quem ela se relacionava.
Mas o que realmente me tocou nesse filme foi a construção da personagem. A facilidade com que Colette colocava as palavras no papel e o seu talento para transformar suas memórias na próxima obsessão dos leitores franceses. Conforme o filme avança, os abusos do marido ficam mais evidentes e você começa a perceber que a personagem vê a escrita como uma tortura, perdendo completamente a sua paixão por um talento que lhe vem com tanta naturalidade.
Knightley tem uma interpretação autentica e eu não consigo imaginar nenhuma outra atriz que pudesse entregar as emoções da de Colette de uma forma tão verdadeira. Ela protagoniza o filme como se fosse a única personagem, todo os outros, mesmo os personagens que deveriam ter um certo destaque, acabam se tornando meros coadjuvantes nas cenas em que ela está presente. Engraçado que, até hoje, eu não vi um filme em que a atuação de Knightley me decepcionou.
A forma como a protagonista cresceu ao longo da trama é realmente impressionante. Nós começamos com uma jovem do campo, ainda se adaptando a vida de casada e terminamos com uma jovem mulher, capaz de dar voz a muitas outras mulheres, dona do seu próprio mundo, da sua própria vontade. Não é apenas um enredo inspirador, mas também um enredo que traz muita realidade para o que realmente acontecia nos bastidores daquela época.
Wash Westmoreland entrega um enredo que não se prende ao melodrama, criticando a sociedade da época e ainda construindo aos poucos uma protagonista que, no ápice do enredo finalmente encontra sua verdadeira identidade e se liberta da opressão que a impede de ser quem realmente deseja. Colette é uma adaptação de tirar o fôlego, inspiradora e embora pouco provável de ser indicado ao Óscar, prova por A mais B que a indústria do cinema subestima os talentos da Keira Knightley.