O último livro lançado pela Íris Figueiredo, Céu Sem Estrelas, foi minha primeira leitura da autora. Eu a acompanho nas redes sociais há um tempo, conheço por nome e sinopse outras obras dela, mas essa publicação da Seguinte foi meu primeiro contato com a autora. E esse primeiro contato não poderia ter sido mais especial, mais forte e marcante. Tudo por conta da sensibilidade e honestidade com as quais Íris colocou nas páginas que contam a história de Cecília.
Já basta a capa ser linda demais, tanto pelas cores, quanto pela ilustração, a sinopse me chamou a atenção. E confesso que a propaganda feita por outros leitores e autores também me conquistou. Nunca mais verei um fusquinha azul com os mesmos olhos, apesar de sempre ter brincado disso, vejam bem. Essa leitura me deixou bastante sensibilizada em diversos momentos. Respirem fundo antes de mergulhar de cabeça nela.
“Parte de mim sabia que era irracional, mas a outra repetia o mantra: Você é gorda. Você é feia. Você como feito um animal. Ninguém te acha legal. Ninguém te acha bonita. Ninguém te acha interessante. Nem seu pai gosta de você. As mesmas palavras, sem parar. Não dava para apertar um botão e desligar os pensamentos.”
Dividido em duas partes, Céu Sem Estrelas traz a história conturbada de Cecília, que logo nas primeiras páginas completa a maioridade – dezoito anos – e, com a idade nova, também vê novos problemas. Com uma família cheia de questões tensas, onde sua mãe sempre a tratou como uma boneca, no pior sentido da coisa, deixando a de lado quando não era de interesse, além da inexistência de seu pai e da presença constante de um padrasto desonesto, Cecília parece ter como fuga seu emprego, do qual ela realmente precisa e suas amigas – Rachel, Iasmin e Stephanie.
No entanto, as coisas vão mais por água abaixo quando ela perde o emprego no dia do aniversário e decide sustentar a mentira de que ainda o possui – e a gente descobre, ao longo do livro, que Cecília é o tipo de personagem que tem bastante medo de assumir coisas, que se esconde sempre que pode. Sua autoestima é muito baixa, e isso não é facilitado pelas coisas que ouve e pela imagem que tem de si, por seu peso, pela gordofobia que sofre – e eu nem me atrevo a falar mais do que “sei” sobre isso, apesar de compreender ser um problema. Ela não é magra como as outras garotas de seu meio, e, ao longo das páginas do livro, dolorosamente se culpabiliza por isso. Digo que é dolorosamente porque eu consegui sentir isso.
Há, ainda, uma queda pelo irmão da melhor amiga, Bernardo. E poderia ser um clichêzinho comum, quem já leu fanfic vai imaginar sobre o que eu estou falando, mas a leitura foi bem tranquila e intensa, porque eu shippei e muito o casal – sofri a cada previsão de impedimento e sorri abobalhada a cada cena delicadamente bem escrita pela Íris. O mais agradável foi ver que o foco da história não estava aí, apesar de um casal sempre ser de bom grado e, desse relacionamento, em particular, ser importante para o desenvolvimento da história.
“Às vezes me perguntava o que queria da vida, para onde estava indo, o tipo de coisa que a gente se pega pensando de madrugada, quando ninguém pode entrar na nossa cabeça e ver o quanto é uma bagunça.”
Mas, nem só de romance e drama superficial (não que haja qualquer superficialidade em Céu Sem Estrelas, que fique BEM claro!) vive um livro. E foi aí que Íris Figueiredo me pegou, já que eu reconheci sua sensibilidade e habilidade em discutir assuntos “delicados” logo de cara: há cenas em que Cecília se automutila, por exemplo, e isso pode servir como gatilho para algumas pessoas. É pesado, forte, é bem “intenso”, mas de uma forma verídica. Sem sensacionalismo. Ao mesmo tempo, a autora não aparentou ter colocado essas cenas no livro apenas para preenchê-lo, sem propósitos. É possível ver como tudo se encaixa, como aquilo pertence à personagem, e é muito interessante ver o desenvolvimento da personagem em relação a isso. Achei bastante responsável, mas relembro da possibilidade de servir como gatilho.
Em relação aos cenários de Céu Sem Estrelas, foi muito bom fazer a leitura de um livro que se passa aqui no Brasil, com itens pertinentes. Mais ainda, um livro que se passa em contexto universitário e que se mostra bem verossímil, com direito às choppadinhas, à famosa xerox que arranca dinheiro dos estudantes e com a famosa – mas nem sempre positiva – hierarquia dos calouros e veteranos. Eu consegui relacionar tudo, sabe? Foi fácil visualizar, fácil adentrar a história. Até a canequinha com tirante a Íris colocou em seu livro. Bem brasileira, um nacional bem nacional.
Citei bastante a Cecília, mencionei outros personagens. Mas eles aparecem bem na história, participam efetivamente e se desenvolvem também, de forma efetiva, ao longo do livro. Alguns, mais do que outros, claro, mas acho que deu pra compreender e também foi possível me envolver com todos, durante a leitura, criando apegos, desapegos e ligeiras aversões. E em relação às amizades, às relações de Cecília não terem se focado em romance amoroso, achei ótimo. Enriqueceu a história e expandiu mais as possibilidades do enredo, que, por si só, já tinha muito o que desenvolver. E a Íris não deixou nó sem ponta.
“E, sempre que vejo um fusca azul, lembro que dentro dele cabem pessoas o suficiente para me estender a mão se um dia eu precisar. Isso é força.”
A narrativa, inclusive, é feita também pelo Bernardo, além da Cecília. Então, acompanhamos os feitios dele ao longo do enredo, como ele se porta em relação à Cecília, e temos a oportunidade de enxergar a protagonista por outro ponto de vista, por outra lente. Vê-la sendo descrita por outras palavras – majoritariamente bem mais gentis do que a mesma usa consigo. E a química entre os dois personagens, não apenas romanticamente, mas enquanto complementos narrativos, é ótima.
No geral, foi uma leitura bem proveitosa pra mim, que não consegui desgrudar do livro até o fim da história. Nunca tinha lido um livro abordando tais temas, todos juntos – a questão da autoestima e autoaceitação, da automutilação -, ao menos nunca de forma tão responsável. Minha estreia como leitora da Íris Figueiredo foi muito positiva, e talvez tenha valido à pena esperar pela leitura, pois a expectativa inicial foi bastante válida.
Minha intenção é devorar os outros livros da autora, o mais rápido possível. Essa leitura é importante, para toda e qualquer pessoa, é nítido. Se você já leu Céu Sem Estrelas, deixa um comentário com sua opinião, para sabermos o que você achou e conversarmos a respeito. Se não leu, tem interesse, ou algo te impede ainda? Me conte! E é aquilo: minha recomendação é forte. Você vai querer abraçar o livro, os personagens e nunca mais largar!